quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Neste leito de ausência em que me esqueço
desperta o longo rio solitário:
se ele cresce de mim, se dele cresço,
mal sabe o coração desnecessário.

O rio corre e vai sem ter começo
nem foz, e o curso,que é constante, é vário.
Vai nas águas levando, involuntário,
luas onde me acordo e me adormeço.

Sobre o leito de sal, sou luz e gesso:
duplo espelho - o precário no precário.
Flore um lado de mim? No outro, ao contrário,
de silêncio em silêncio me apodreço.

Entre o que é rosa e lodo necessário,
passa um rio sem foz e sem começo.


* * *

Fluo obscuro de mim, enquanto a rosa
se entrega ao mundo, estrela tranqüila.
Nada sei do que sofro.
O mesmo tempo
que em mim é frustração, nela cintila.

E este por sobre nós espelho, lento,
bebe ódio em mim; nela, o vermelho.
 Morro o que sou nos dois.
O mesmo vento
que impele a rosa é que nos move, espelho!

Ferreira Gullar

Nenhum comentário:

Postar um comentário